Meu Tio Katarino
Não é verdade. Os homens não são todos iguais. Cresci até aos meus 10 anos
com um homem fantástico. O meu tio Katarino, passava grande parte do ano na
casa da aldeia, no sítio do santuário de Nossa Senhora de Fátima. Era uma casa
rodeada de árvores, as suas preferidas: Marmeleiros e Roseiras vermelhas que o
inspiravam e lhe transmitiam desejo e pecado. Era uma casa muito engraçada,
tinha telhados de vidro, uma bruta lareira e potes onde fazia questão de mostrar
os seus dotes culinários, um grande salão que servia de biblioteca/ escritório
de reclusão para o jurisconsulto, meditação e escrita, 6 quartos todos com
janelinhas viradas para o Monte da Virgem onde se deliciava, todas as manhãs, a
ver a pastora Estrelinha a pastar o gado e a cantar a canção “Os teus olhos
castanhos”. O meu Tio era um historiador muito carinhoso, sonhador e também
solitário…imune à tentação do matrimônio. A sua paixão por mulheres e árvores
era prática… adorava passear as amigas que o visitavam amiúde, pela floresta e
jardim. Tanto que acabou por dar o nome de cada uma delas às árvores de
marmelos espalhadas pelo jardim a contrastar com as roseiras. Dizia ele que
achava uma beleza medonha… o cheiro da Terra a bosta, o cheiro dos marmelos maduros
e o cheiro das pétalas das rosas…levando-o a voar sem asas o pensamento. Foi
graças a ele que me tornei uma sobrinha viciada em marmelada e banhos em água
de rosas, coisa que me levou, nos meus períodos de maior lucidez, a tentar
escrever, precisamente, a história da vida dele misturando um resto da sua
sensatez colhida de hábitos antigos repletos de amor, amizade e gratidão, hoje
raros em quase todas as famílias. Hoje, já ninguém se dedica a apreciar árvores,
a acariciar, construir, planear, cuidar, ou, apenas, a gozar a beleza de um
jardim.O meu Tio Katarino para escapar às criticas da criadagem… sobre as suas loucuras saudáveis e arte de bem receber as amigas... sobre o seu hábito de acariciar e cheirar os marmelos, argumentava que o seu jardim era um lugar sagrado e que lhe dava uma inspiração maluca. Recordo a mesa de pedra redonda em frente ao lago coberto de pétalas que ornamentava o pátio que ele adorava…serviu para servir as refeições afrodisíacas às suas estimadas amigas.
Agora apeteceu-me sorrir…aos gemidos que algumas vezes ouvi no calor de Agosto – malvado – ele dizia-me que eram os vapores umedecendo a terra agradecida . Enfim, o meu Tio Katarino tinha uma filosofia de vida, uma ocupação da escrita, e uma dedicação às queridas amigas impopular aos olhos dos outros. Nobre e, por isso, impopular.
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